Práticas institucionais/discursivas acerca dos cuidados com os bebês prematuros e/ou de baixo peso: o programa canguru

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DATA DE PUBLICAÇÃO

2010

RESUMO

O Programa Canguru foi implantado no Brasil em 2000 através de uma política pública do Sistema Único de Saúde (SUS), sustentado sob a retórica da humanização dos serviços de saúde. Este programa adota a prática de colocar o bebê prematuro e/ou de baixo peso em contato pele a pele com sua mãe com o intuito de fortalecer o vínculo afetivo entre mãe e bebê, incentivar o aleitamento materno e promover maior segurança nos cuidados com seu filho. As mães usuárias do SUS são, dessa forma, solicitadas a residirem na maternidade, participando dos cuidados com o bebê, até sua alta. No entanto, constatou-se, em observações prévias, que a participação no Programa Canguru tem sido geralmente uma imposição para essas usuárias. Assim sendo, procurou-se interpretar os textos que permeiam o desenvolvimento da prática Canguru. Essa pesquisa foi realizada através de dois estudos: 1) exploração histórica do conceito de maternidade e análise de como a maternidade é apresentada no módulo do documento oficial que orienta o programa; 2) análise da dinâmica institucional que permeia o Programa Canguru, enfatizando o estudo acerca do processo de trabalho dos profissionais da saúde e a compreensão da percepção das usuárias sobre sua estadia na maternidade e sobre a dinâmica de atendimento. Destaca-se que a relação entre esses dois estudos permitiu a compreensão da forma que os discursos podem influenciar o comportamento dos profissionais de saúde e que implicações os discursos destes têm na prática cotidiana do atendimento em saúde. A pesquisa, fundamentada na metodologia da Etnografia Institucional, considera as práticas e experiências como socialmente organizadas, procurando entendê-las na sua dinâmica e interdependências. A perspectiva adotada para a análise documental, como também para o estudo dos dados qualitativos construídos na pesquisa empírica, foi a análise do discurso. A pesquisa mostrou que embora o Programa Canguru venha demonstrando resultados positivos, tanto em relação à economia de recursos quanto aos aspectos psicológicos e biológicos do bebê, por outro lado ele falha em considerar a complexidade social, econômica e cultural das mães e as limitações estruturais do sistema de saúde pública. O documento oficial deste programa apoia-se na racionalidade médica e econômica, cuja concepção centra-se no modelo biomédico hegemônico e nas condições de vida e estruturação de família de uma população que não é usuária do Sistema Único de Saúde. Essa dissonância dificulta o sucesso do programa, uma vez que suas ações são planejadas e criadas sem consideração às condições de vida e experiências das pessoas que fazem uso desse serviço. Com relação à dinâmica institucional, observou-se que, embora alguns profissionais se diferenciem no tratamento com as usuárias, a maioria deles desconsidera o papel ativo da mãe nesse método de intervenção. Por outro lado, a pesquisa mostrou que as mães veem o programa como uma obrigação e não uma opção que implique em momentos prazerosos no ambiente hospitalar. Ressalta-se, assim, que a implantação deste programa requer não só a presença e o treinamento para o bom atendimento da equipe de funcionários, como também deve ser levado em consideração a complexa rede de determinantes sociais da saúde que podem influenciar na participação das mães no programa. Discutir e problematizar o cotidiano de programas como esse se constitui, dessa forma, um exercício de reflexão sobre cidadania e governança, permitindo espaços para a melhoria dos programas de saúde pública

ASSUNTO(S)

programa canguru etnografia institucional maternidade psicologia social kangaroo program institutional ethnography motherhood

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