Espaços divididos e silenciados: um estudo sobre as relações sociais entre nativos e os "de fora" de uma cidade do interior paulista.

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DATA DE PUBLICAÇÃO

2006

RESUMO

Este estudo pretende compreender, sob a perspectiva metodológica da História Oral e com dados quantitativos, a construção e reprodução das múltiplas identidades e sociabilidades existentes entre os trabalhadores rurais, de origem mineira e nordestina, que migram para Guariba, cidade-dormitório de economia sucroalcooleira do interior de São Paulo. Para tornar possível esta compreensão, foi necessário determinar em quais contextos estas identidades e sociabilidades são construídas, ou seja, de que forma a comunidade circundante, com seus pensamentos, memórias e valores, interfere nestas relações sociais. Percebemos que, entre os dois grupos, existe uma dicotômica e dialética relação baseada em preconceitos e violência simbólica, como também em uma estereotipada conexão migrantes criminalidade, que em Guariba é ainda mais perceptível devido à Greve dos trabalhadores rurais de 1984. Esta dicotômica relação é viabilizada a partir de uma ideologia que perpassa todos os grupos sociais de Guariba, e que divide a cidade entre os que denominamos nativos (de descendência européia, moradores do centro da cidade, representantes da classe média e brancos) e de fora (migrantes mineiros e nordestinos, moradores de bairros periféricos, representantes da classe baixa e negros). Frente aos estigmas do grupo nativo a que estão submetidos, os de fora, por serem um grupo heterogêneo, têm reações diversas e multifacetadas, que podem ser divididas entre três subgrupos: os de fora migrantes sazonais, os de fora migrantes estabelecidos em Guariba há décadas e os de fora pertencentes à segunda e terceira geração de migrantes. Homens e mulheres que migram anualmente, durante a safra e a entressafra da cana-deaçúcar, exercem papéis sociais diferentes nas cidades que os recebem e em sua terra natal. Ao voltarem para as terras de origem, quando bem sucedidos nas lavouras de cana do interior paulista, recebem uma diferenciação social e cultural a partir de suas novas identidades e bens materiais. Ainda no mundo moderno em que migraram, a relação é inversa. Os meios de sociabilidade são escassos e tensos, com bases discriminatórias, uma vez que, para a comunidade nativa, os migrantes são representantes de um mundo tradicional e indesejado. Os migrantes que vivem na cidade há mais tempo já conseguem ampliar seus vínculos de sociabilidade, que ganham os espaços dos bairros periféricos em que moram. No entanto, sabem que existem locais da cidade em que não são bem vindos, ao mesmo tempo em que rememoram e revivem os locais de suas terras de origem, onde se sentem verdadeiramente no lugar da gente: quanto mais migram, mais ficam no mesmo lugar. O representante da segunda e terceira geração de migrantes, por sua vez, se considera (e de fato é) cidadão guaribense, fruto das relações modernas paulistas, e por isto entende que todos os espaços da cidade são seus por direito. No entanto, por também ser considerado de fora, percebe com facilidade os estigmas a que está submetido, e acaba mais suscetível às relações de violência, o que nos leva a crer que a violência simbólica do nativo viabiliza entre este grupo uma violência real. O migrante, enfim, não experimenta apenas o encontro entre os diferentes, mas vivencia, acima de tudo, as desigualdades e disparidades sociais das cidades paulistas. A relação que os migrantes têm com a comunidade circundante mascara um preconceito de cor/raça, como também de classe, contra este grupo que nunca será nós; será sempre o de fora.

ASSUNTO(S)

história oral identidades sociais guariba conflito social guariba oral history relações sociais trabalhadores rurais migration violência simbólica ideologia sociability symbolic violence social identities migração sociabilidade migracao rural workers ideology

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