Da canalhice à redenção: Nelson Rodrigues e o Supereu brasileiro

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DATA DE PUBLICAÇÃO

2008

RESUMO

Este trabalho realiza uma intersecção entre a psicanálise de Freud (1856-1939) e a literatura do carioca Nelson Rodrigues (1915-1980). O objetivo principal é proceder a uma análise da obra rodriguiana com fins a demonstrar a presença do Supereu na canalhice e na neurose buscando compreender as idiossincrasias do mal-estar na cultura no Brasil. As funções do Supereu (auto-observação, consciência moral e formação de ideais) transformam-se de acordo com o contexto histórico e sociocultural. Isso evidencia a necessidade de situar o conceito freudiano na realidade brasileira. A construção histórica do país criou formas próprias de colocar o embate entre o desejo e a censura. A ficção rodriguiana é rica para a elucidação da problemática moral superegóica. Recorrendo a personagens, situações ou motivos que colocam o conflito como uma estrutura sempre presente na existência, o dramaturgo carioca construiu um abrangente mapeamento da moral na sociedade brasileira. Devido aos temas tabus e polêmicos que abordou, ele se classificava como criador de um teatro "desagradável". Nelson teceu críticas à renúncia pulsional nos tempos modernos que gera a apatia e a autocoerção, típicas da neurose obsessiva. Freud postula que a criação literária pode atuar sobre o Supereu de modo a proporcionar um destino sublimado para a pulsão, diferenciado do sintoma. As forças que impelem os artistas a criar são os mesmos conflitos que, em outras pessoas, levam à neurose e incentivam a sociedade a construir suas instituições. Um dos objetivos do artista é libertar-se por meio da comunicação de sua obra a outro que sofra de conflito semelhante e proporcionar-lhe, também, alguma libertação. Pensamos que, por meio de sua criação literária, Nelson Rodrigues conseguiu uma alternativa para o adoecimento psíquico que o espreitava, pois, a constelação trágica de sua vida, os sofrimentos na carne e na alma, poderiam ter desencadeado psicopatologias incapacitadoras. Seu talento representa uma simbolização para o escarafunchar.na lama humana recalcada diante de forças moralizantes.Concluise que a ironia fina rodriguiana foi audaciosa em cunhar poeticamente aquilo que representa o ‘óbvio ululante’ da canalhice no Brasil bem como sua possível redenção. Temas que, ao lado da cafajestagem, do cinismo, da remissão e do arrependimento, povoam o cotidiano da clínica e ficaram patentes na obra do dramaturgo. Ele redimensiona o universal, impregnando-o daquilo que podemos chamar de brasilidade. Assim, ele demonstra que tais temas constituem especificidades do nosso mal-estar na cultura. Nelson muito nos ensina sobre o campo clínico, pois aponta possibilidades criativas para o animal humano, que, muitas vezes, tem que se abismar em seu próprio horror para sair de lá um pouco menos cego.

ASSUNTO(S)

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