Bioética e biodireito: discursos jurídicos acerca do aborto por grave anomalia fetal

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DATA DE PUBLICAÇÃO

2007

RESUMO

A partir do advento de novas tecnologias de diagnóstico pré-natal, passou a ser possível a identificação intra-uterina de graves anomalias fetais. Contudo, o avanço da Medicina ainda não permite, na grande maioria das vezes, a disponibilização de tratamento para essas enfermidades. Por isso, o aborto adquire um sentido diferenciado, na medida em que se coloca como a única opção disponível para amenizar o sofrimento daqueles, gestantes ou casais, que, diante da impossibilidade de sobrevivência do feto após o nascimento, afirmam não poder suportar levar a termo a gravidez. Isso se reflete também no âmbito jurídico, principalmente por meio das ações judiciais que demandam autorização para a realização do aborto. Diante da ausência de regulamentação legal da questão, a resposta tem sido dada pelo Poder Judiciário. O objetivo principal deste trabalho é o de verificar quais são os discursos jurídicos proferidos sobre o tema, bem como o de compreender os significados que engendram esses mesmos discursos, dando-se especial ênfase à questão da gestante. Como objetivos específicos, cabe citar: a realização de um estudo histórico referente ao aborto, a averiguação das questões éticas suscitadas diante da aplicação das novas tecnologias de diagnóstico pré-natal, o exame do conteúdo dos princípios e direitos constitucionais que dizem respeito ao tema, a análise dos projetos de lei em tramitação no Brasil, a realização de um estudo de jurisprudência, a apreciação dos argumentos suscitados pela Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental n 54, a verificação da abrangência do conceito de gênero, a compreensão da maternidade como uma importante constituinte do gênero feminino, e suas conexões com a maternidade, a observação do processo de reconhecimento dos direitos sexuais e reprodutivos e, por fim, a investigação do conteúdo ideológico do Direito. Como metodologia, recorreu-se à pesquisa bibliográfica descritiva de caráter interdisciplinar, abrangendo não só a área jurídica, mas também a História, a Filosofia, a Saúde, a Bioética, a Antropologia e a Sociologia. Foi efetuada também pesquisa documental, envolvendo tratados e convenções internacionais, leis, projetos de lei, ações e decisões judiciais. Percebe-se que os discursos jurídicos proferidos acerca da gestante nos casos de aborto por grave anomalia fetal têm profundas conexões com o papel de gênero feminino tido por ideal, especialmente com a relevância que a maternidade adquire no exercício desse papel. Dessa forma, se a maternidade é representada como destino biológico, o aborto significa a negação da própria natureza feminina. Além disso, o aborto, nos casos de grave anomalia fetal, contraria o ideal do instinto maternal, na medida em que demonstra o caráter cultural do amor incondicional da mãe pelo filho e dos sacrifícios que fariam parte do exercício da maternidade. No caso da reprodução dessas noções pelo Direito, verifica-se que isso é devido ao fato de que ele se constitui num fenômeno ideológico, permitindo a manutenção de um determinado status quo e operando como produtor e reprodutor de verdades. Assim, verifica-se que a liberdade da gestante não e passível de legitimação jurídica, pois ela não é considerada como sujeito moral, capaz de realizar escolhas no campo da reprodução

ASSUNTO(S)

bioética anomalia fetal aborto medicina direito serious fetal anomaly pregnant abortion

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